segunda-feira, 5 de março de 2012

Crie o retrato falado de seu personagem dileto

Na literatura, a construção de um personagem é um processo que nenhum escritor, por mais talentoso que seja, consegue dominar por inteiro. É claro que há um consenso sobre quais são as características de um Dom Quixote, por exemplo, mas ainda assim cada leitor que abrir o clássico de Cervantes terá a liberdade de tirar suas próprias conclusões, emular na imaginação seu próprio Quixote. Ou fazer um retrato falado do fidalgo mais famoso da Península Ibérica... 

Humbert Humbert criado pelo
The Composites
É isso que oferece o site The Composites, do escritor e artista nova-iorquino Brian Joseph Davis. Com a ajuda de um software utilizado pela polícia na elaboração de retratos falados de criminosos, o The Composites recria a face de vários personagens da literatura clássica, de acordo com as sugestões de internautas. 

Se você leu Lolita, de Vladimir Nabokov, e não ficou satisfeito com James Manson na pele de Humbert Humbert, pode ir lá e dar uma olhada na versão “Wanted” do personagem. Emma Bovary, do romance Madame Bovary, de Gustave Flaubert, também está por lá, em desenho baseado na descrição feita pelo autor francês. Veja só:



“O que ela possuía de lindos eram os olhos: apesar de castanhos, pareciam pretos por causa das pestanas; o olhar era franco, e de um certo arrojo cândido. Os cabelos, cujos bandos pretos pareciam inteiriços, tão lisos eram, apartavam-se ao meio da cabeça por uma risca muito fina, que se prolongava, seguindo a curva do crânio” 

Para construir as imagens, Davis usou o programa forense "Faces ID", que possui um banco de mais de 10 mil características faciais. Para as falhas de descrição, casos em que os autores não mencionam, por exemplo, a aparência de um nariz, ou de uma boca, o criador do site valeu-se de informações subentendidas, como a época em que o livro foi escrito, elementos históricos e culturais fornecidos pela ficção. "É uma combinação de crítica literária − que conheço bem − e forense − da qual eu sou um amador total", afirma Davis.

Em entrevista à revista The Atlantic, o escritor artista se refere ao projeto como uma nova forma de interpretar e se envolver com a literatura. De acordo com Davis, o leitor busca esse tipo de interação, e quer viver os livros de uma nova maneira, como uma espécie de evolução cultural. Mas, é claro, o idealizador do The Composites também recebe muitas críticas pelo seu trabalho. 

"Os leitores imaginam estes personagens a partir das versões cinematográficas das obras", diz Davis. "Muitas pessoas reclamaram, por exemplo, que o meu Rochester [personagem do romance Jane Eyre, de Charlotte Brontë] não se parece com Michael Fassbender [ator que viveu Rochester na versão de 2011 para o cinema]." 

Apesar dos apelos de internautas, Davis não conseguiu produzir imagens dos rostos de Holden Caulfield – o protagonista de O Atirador no Campo de Centeio, de J.D. Salinger – ou de Kilgore Trout – personagem recorrente na obra do americano Kurt Vonnegut. Segundo Davis, não há descrições físicas suficientes dos personagens nos livros de Salinger e Vonnegut. 

O escritor, que também edita uma revista literária, acredita que a internet pode ajudar a resgatar o interesse em literatura, ao oferecer novas formas de engajamento do público leitor com as obras. 

"A resposta das pessoas a esse projeto por parte de fãs em literatura prova, de certa forma, que as pessoas querem ter experiências em literatura de formas completamente novas, e que existem várias ferramentas para se fazer isso”, finaliza. 

Fontes: BBC Brasil e Colherada Cultural


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