O cinema foi fundamental para definir a identidade brasileira |
Pouco mais de sete anos após a fundação da República, o ambulante italiano Vittorio di Maio, radicado em Petrópolis, projetou pela primeira vez imagens em movimento sobre o solo tupiniquim. Dentre os títulos exibidos nos dias 1º e 6 de maio de 1897 na cidade imperial, estavam Um artista trabalhando no trapézio do Polytheama, Chegada do trem em Petrópolis e Ponto final da linha de bondes de Botafogo – vendo-se os passageiros subir e descer. Vittorio provavelmente tencionava apenas chamar a atenção de um número maior de potenciais fregueses, uma estratégia de marketing que incluía o cinematógrafo. No entanto, o que essas gravações do cotidiano carioca do século XIX inauguraram, de fato, foi a representação do país nas telas de cinema.
"A nação é uma comunidade imaginada porque os membros, até mesmo da menor nação nunca conhecerão a maioria de seus compatriotas, nunca os encontrarão ou sequer ouvirão falar deles, ainda assim, na mente de cada um deles, vive a imagem de sua comunhão" – Benedict Anderson
A ideia de nação que temos atualmente não é algo natural, trata-se de um conceito moderno que, por interesses políticos e econômicos, foi inventado através da recombinação de práticas culturais pré-existentes, de forma a conferir um passado e identidade comuns a um determinado grupo de indivíduos. Esses recém-apresentados compatriotas passam então a integrar o que Benedict Anderson chamou de comunidades imaginadas, e tratam de perpetuar essa noção de comunhão, ou nacionalidade, utilizando todos os discursos possíveis, como a música, a literatura, cinema e imprensa.
Irmãos Lumière e o cinematógrafo: primeiro take de uma longa história |
Apesar de seu alcance limitado nas primeiras décadas do século XX, o cinema brasileiro pode ter tido papel importante na formação do nosso ideal de nacionalidade desde sua gênese, e os dados sobre o analfabetismo no país são um bom indício para confirmar essa tese: em 1890, pouco menos de 20% dos brasileiros eram alfabetizados; em 1950, sessenta anos depois, meio país ainda não conseguia ler uma palavra escrita, o que diminui consideravelmente o poder de alcance da literatura e da imprensa nas seis primeiras décadas da República. Os meios discursivos audiovisuais, como o cinema e a música, sem dúvidas tiveram grande relevância na forma pela qual apreendemos nossa própria identidade. Para construir um pequeno esboço dessa história – restrita aqui ao cinema – vejamos como os cinematógrafos se espalharam para além das fronteiras de Petrópolis.
Primórdios do cinema brasileiro – Primeira República
Estátua de Francisco Serrador na Cinelândia |
O primeiro passo para a construção de um circuito cinematográfico sólido no Brasil foi a estabilização do fornecimento de energia em 1907, com a ativação da usina de Ribeirão das Lajes. Sem sofrer com a inconstância da rede elétrica, os exibidores e produtores de filmes prosperaram: só no segundo semestre daquele ano, mais de vinte novas salas de cinema brotaram ao longo da Avenida Central, no Rio de Janeiro – atual Rio Branco. Maior empresário do ramo de cinema no Brasil, Francisco Serrador, responsável por grandes sucessos da época como O Cometa, também foi o grande artífice da área que ganhou o nome de Cinelândia, dada a grande quantidade de cinematógrafos no local.
Nesses primeiros anos do cinema nacional, que ficaram conhecidos como Belle Époque, os temas mais abordados pelos cineastas eram os crimes de grande repercussão, os melodramas, comédia de costumes, filmes políticos, posados e cantantes. O cinema, apesar de frequentar lugares nobres como Salão de Novidades Paris, de Paschoal Segretto, ainda era visto pela burguesia como divertimento de iletrados. Não raro as salas de exibição eram invadidas por policiais e interditadas, e por isso, mesmo nessa época de desenvolvimento da produção cinematográfica no país, os exibidores dependiam de suas relações com figuras influentes da sociedade para conseguir manter suas salas abertas.
Teatro Colombo, propriedade da Companhia em São Paulo |
Embora cheia de contradições e esbarrando em entraves tecnológicos, a Belle Époque do cinema brasileiro durou quatro anos, de 1907 a 1911, quando uma mudança bem ao norte do continente influiu de maneira decisiva para o futuro do audiovisual por aqui. Nos Estados Unidos, começaram a despontar os grandes produtores de cinema, o que criou uma demanda de novos mercados consumidores – processo similar desenvolveu-se na Europa. Enxergando uma oportunidade fazer bons negócios com essa mudança de cenário, Francisco Serrador, financiado por uma associação de industriais e banqueiros ligados ao capital estrangeiro criou e passou a gerenciar a Companhia Cinematográfica Brasileira. O novo empreendimento de Serrador adota uma estratégia ofensiva no mercado brasileiro: com capital de sobra, compra salas de exibição por todo o país e organiza o circuito cinematográfico brasileiro em função da produção externa, trazendo para cá filmes americanos e europeus. Essa postura, logicamente, sufocou o mercado interno e dificultou sobremaneira a vida dos produtores nacionais.
Sem espaço, os cineastas brasileiros tiveram que apelar para alternativas não muito convencionais para ver seus filmes nas salas de cinema. Uma dessas práticas ficou conhecida como “cavação”. A cavação consistia em procurar alguém com dinheiro suficiente para financiar um filme e que tenha interesse de aparecer nessa película de alguma maneira – para essa artimanha funcionar, os produtores faziam documentários elogiosos a um certo fazendeiro, industrial ou comerciante, ou utilizavam suas propriedades como locação para os filmes. O resultado acabou sendo danoso para o cinema nacional: produzidos com dinheiro das elites, os filmes nacionais passaram a retratar o Brasil sob o prisma dessa classe social, criando uma distorção entre a realidade da tela e aquela vista nas ruas.
Capa da Cinearte, publicação dedicada ao cinema |
A literatura nacional também se tornou um bom caminho para obter algum destaque no mercado cada vez mais competitivo. A fuga para os temas nacionais, através da adaptação de grandes obras da literatura para o cinema, costumava ter algum espaço entre os exibidores, mas não sem causar a ira das classes abastadas. O embate acontecia porque a elite do país tinha uma visão civilizatória do cinema, e encontrava eco nos artigos da Cinearte, revista sobre a sétima arte criada em 1926. Para essas pessoas, os filmes nacionais não teriam que mostrar aquilo que éramos, um país atrasado e pobre, mas sim aquilo que desejávamos ser, ou seja, desenvolvidos. Um artigo publicado no dia 28 de abril de 1926, em protesto ao filme O Brasil Pitoresco, de Cornélio Pires, mostra bem a visão da burguesia brasileira dos anos 20 sobre o papel do cinema:
Quando deixaremos desta mania de mostrar índios, caboclos negros, bichos e outras “avis-rara” desta infeliz terra aos olhos do espectador cinematographico? Vamos que por acaso um destes films vá parar no extrangeiro? Além de não ter arte, não haver technica nelle, deixará o extrangeiro mais convencido do que elle pensa que nós somos: uma terra igual ou peor a Angola, ao Congo ou cousa que o valha. Ora vejam se até não tem graça deixarem de filmar as ruas asphaltadas, os jardins, as praças, as obras de arte, etc, para nos apresentarem aos olhos, aqui, um bando de cangaceiros, ali, um mestiço vendendo garapa em um purungo, acolá, um bando de negrotes se banhando num rio, e cousas deste jaez.
Foram vários os casos em que filmes supostamente “ofensivos” à realidade nacional foram retalhados. EM 1924, O Segredo do Corcunda foi exibido em Portugal e logo recebeu “comentários” tecidos pelo embaixador brasileiro em Lisboa, Antônio Carlos. O diplomata considerou que as cenas com caboclos de fazenda vestidos em farrapos e uma outra em que o capataz espanca um colono eram desnecessárias, e deveriam ser cortadas do filme. Bem antes, em 1912, um filme sobre João Cândido, líder da Revolta da Chibata, foi censurado e nunca chegou a ser exibido.
Nosso cinema, controlado pela elite, queria impor uma visão de Brasil que não correspondia em nada à realidade. Como observou o antropólogo Renato Ortiz, havia uma defasagem entre a modernidade enquanto dado cultural (superestrutura) e dado do sistema social de produção (infraestrutura), o que deixava o Brasil dos cinemas numa “posição esdrúxula de existir sem realizar”.
Ciclos Regionais
Com poucos recursos, cineastas de todo o país penavam para exibir suas produções |
Fora do Rio de Janeiro, maior expoente da indústria cinematográfica brasileira na Primeira República, apaixonados pela sétima arte também se organizavam para conseguir produzir filmes e exibi-los, ainda que por um curto período de tempo. Dentre essas organizações, se destacaram os chamados ciclos de Recife e Cataguases, muito por conta das relações mais estreitas que mantinham com os editores da Cinearte, que financiavam esse tipo de projeto.
Em Recife, o movimento cinematográfico envolvia cerca de 370 jovens, jornalistas, pequenos funcionários, comerciantes, operários, artesãos, atletas, músicos populares e ex-atores de teatro, que se revezavam em torno de um ou outro cinegrafista para dar vida aos seus projetos. Em 1925, fundaram a Aurora Filmes, cujo primeiro título foi Retribuição. Algumas outras produtoras surgiram em Recife, mas não duraram muito. A exibição dos filmes dentro dos limites do estado não era suficiente para cobrir os custos de produção, e era difícil exportar o filme para outros estados, o que levou as produtoras do ciclo recifense à bancarrota.
Em Cataguases, a história não foi muito diferente. Foi lá que surgiu Humberto Mauro, que posteriormente se tornaria um dos maiores cineastas da história do cinema brasileiro. Da parceria entre ele e Pedro Comello nasceu a Phebo Sul American Film, cujo primeiro filme foi Na Primavera da Vida, de 1926, sob direção de Humberto Mauro. Assim como em Recife, as dificuldades financeiras minaram a continuação do ciclo de Cataguases, somadas ao descontentamento dos editores da Cinearte com a insistência em temas ligados ao regionalismo – vale lembrar que Cataguases fica na Zona da Mata mineira.
Da Belle Époque ao fim da Primeira República, pode-se dizer que o cinema brasileiro se viu polarizado por duas vertentes conflitantes: de um lado, a tradicionalista, que promovia um retorno às raízes históricas e culturais da nação; do outro, a visão modernista, com apelo ao urbano, ao luxo e à sofisticação que ainda se mostravam incipientes em nossa sociedade. Nesse contexto, a representação identitária da nação se deu de maneira desordenada, sem um verdadeiro projeto nacional, o que começa a mudar com a ascensão de Vargas ao poder depois da Revolução de 1930.
Hollywood e suas influências
A partir da década de 30, o cinema americano ganha a hegemonia no mercado internacional e passa a influenciar todos os outros polos de produção cinematográfica, incluindo o Brasil. Antes de falar de como essa influência mudou nossa maneira de produzir filmes, vejamos porque o cinema americano conquistou tamanho poderio.
O sucesso de Hollywood fundamentou-se num tripé que coordenava a produção americana de filmes: o sistema de estúdios, a mitificação de atores e atrizes – estratégia chamada de star-system – e a regulação de conteúdo, que teve como símbolo maior o Código Hays.
Através do sistema de estúdios, foi possível adequar a realização de filmes à lógica capitalista de produção, aplicando os princípios de racionalidade e planejamento para otimizar o produto final, ou seja, ampliar a margem de lucro. Anteriormente, havia uma concentração de tarefas nas mãos do diretor, o que muda com o sistema de estúdios: surgem os departamentos especializados, como os de roteiro, direção de arte, figurino, efeitos especiais e assim por diante – era a transposição da linha de montagem fordista das fábricas para Hollywood.
Marilyn Monroe, uma das mais célebres estrelas de Hollywood |
O segundo ponto de apoio deste tripé é o star-system, que não era exatamente uma novidade – Hollywood sempre lançou mão dessa glamourização dos artistas envolvidos com o cinema. Entretanto, a partir da década de 30, as estrelas de cinema deixam seus postos de semideuses e passam a colaborar com o fomento da sociedade de consumo, participando de propagandas e humanizando seu estilo de vida.
Por fim, a regulação de conteúdo promovida pelo Código Hays veio para harmonizar as relações dos produtores de cinema com as camadas sociais que detinham o poder na sociedade americana daquele período. A regulação sempre foi prática comum nos EUA, principalmente porque o cinema era visto como uma fonte de informação e diversão muito influente entre a classe operária. O problema é que, depois da depressão no final dos anos 20, o público do cinema diminuiu, e os grandes estúdios americanos passaram a carregar os filmes com mais histórias de sexo e cenas de nudez. Essa tática para trazer de volta os espectadores afastados pela crise desagradou provocou uma forte reação dos grupos religiosos, que conseguiram impor o código de auto-censura a Hollywood a partir de 1934, alinhando o cinema aos novos ares trazidos pelo New Deal de Delano Roosevelt. A partir dessa mudança, o cinema tornou-se um baluarte dos princípios morais, sociais e econômicos básicos da cultura americana.
Marlene Dietrich na capa da revista O Cruzeiro: vida das celebridades vira produto |
Com acesso quase irrestrito ao circuito nacional, o cinema hollywoodiano ajudou a disseminar o American Way of Life, que foi recebido pela imprensa brasileira como a senha para o desenvolvimento. A exaltação do trabalho, o individualismo, consumismo, o mito do self made man, todas esses princípios americanos invadiram a mídia brasileira. A presença de personagens de filmes hollywoodianos na publicidade aumentou vertiginosamente, a vida dessas estrelas era devassada nas revistas e jornais. A revista O Cruzeiro, por exemplo, publicou em 25 de março de 1933 a agenda da atriz Constance Bennett, com horário e descrição de cada atividade. A introdução escrita pela revista ilustra bem o novo tipo de relação do público com o cinema vindo dos EUA: “Para os leitores que gostariam de saber como passam os dias os seus artistas predilectos, vamos revelar aqui o dia de Constance Bennett, que pode servir de paradigma”.
Essa influência, é claro, também alterou os parâmetros que existiam sobre o que deveria ser a produção cinematográfica brasileira. A conjunção do modelo clássico de narrativa utilizado exaustivamente por Hollywood com a mistificação da vida na tela, passou a nortear os principais críticos do cinema brasileiro no final de década de 20 e boa parte dos anos 30, em especial a Cinearte.
Só que, a partir de 1930, o Brasil começa a fazer parte de um projeto de nação planejado pelo governo. No governo de Getúlio Vargas, como veremos a seguir, o cinema ganha papel essencial na construção de uma identidade brasileira.
Cinema na Era Vargas
“O papel do cinema pode ser verdadeiramente essencial. Ele aproximará, pela visão incisiva dos fatos, os diferentes núcleos humanos, dispersos no território vasto da República... Os sertanejos verão as metrópoles, onde se elabora o nosso progresso, e os citadinos, os campos e os planaltos do interior; onde se caldeia a nacionalidade do porvir.” – Getúlio Vargas
A chegada ao poder de Getúlio Vargas, através do acontecimento histórico que ficou conhecido como Revolução de 30 – muito embora o emprego do termo “revolução” possa ser questionado – trouxe de fato novidades para o comando da República. Saíamos da velha lógica da política do café com leite, sem, no entanto, escapar das oligarquias. A complexidade dessa mudança política na condução do país mereceria um artigo à parte, mas nos concentremos naquilo que impactou o cinema brasileiro.
Era preciso estar alinhado aos dogmas do Estado para não acabar censurado |
Com o poder em novas mãos, o conceito de nação passou a ser repensado e incluiu o cinema como um dos principais meios de propagação dos ideais nacionais. Ao mesmo tempo em que todas as diretrizes sobre aquilo que deveria ser pensado como nacional estavam centralizadas no Estado, houve um incentivo maior para que intelectuais pesquisassem sobre o tema, num esforço de integração e unificação das inúmeras características e peculiaridades existentes no território nacional. Multifacetado, o governo de Vargas utilizava o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) para controlar de perto as letras das músicas populares, coibia com violência artistas considerados “subversivos”, mas ao mesmo tempo incorporava aquilo que era visto como cultura popular.
Essa dualidade de um Estado ao mesmo tempo repressor e convidativo a manifestações populares fica expressa no Artigo 122 da Constituição de 1937, que vigorou durante o Estado Novo: “Todo cidadão tem o direito de manifestar o seu pensamento, oralmente, ou por escrito, impresso ou por imagens, mediante as condições e nos limites prescritos em lei”. Como as prescrições da lei eram ambíguas, acabava valendo aquilo que era permitido pelo cassetete das rondas policiais.
Associando valores como Estado, Pátria, Nação e povo, o Estado Novo passou a articular uma nova visão de nação brasileira, adotando a cultura popular como instrumento de doutrinação – tendo como um dos braços realizadores o cinema. Nesse processo, desempenharam papel importante o cinema educativo documental e os cine-jornais, assim como o cinema ficcional. Todos procuravam veicular a imagem de um universo quase perfeito, em que todos os problemas e conflitos estavam prestes a ser resolvidos.
O período democrático
Com o fim da ditadura estadonovista, os discursos sobre identidade nacional diversificaram-se e escaparam ao controle do Estado. Nesse período, dois projetos fundamentalmente distintos duelaram pela soberania na construção da identidade brasileira: o projeto nacionalista do ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) e a visão liberalista da ESG (Escola Superior de Guerra). Enquanto o primeiro buscava uma reforma social e maior autonomia frente aos EUA para impulsionar o desenvolvimento nacional, a ESG pregava as benesses da agricultura e a agenda de segurança defendida pelos americanos durante a Guerra Fria.
Nesse contexto, surgiram movimentos e iniciativas que tentavam erigir um retrato do Brasil através do cinema, dentre as quais destacam-se a Atlântida e a Vera Cruz.
Atlântida e as chanchadas
Criada em 1943, a Atlântida obteve destaque principalmente a partir das chanchadas que produzia. Definidas por Afrânio Catani como “produções pobres, apressadas, dirigidas para e sustentadas por um público urbano semi-analfabeto e proletarizado”, as chanchadas têm uma estrutura narrativa bem simples: a partir de um tema básico, o personagem principal que conduz a narrativa é levado a concretizar determinado objetivo em decorrência de um lance de sorte qualquer.
Representação da sociedade urbana em crescimento, as chanchadas não possuem qualquer vínculo com o discurso oficial sobre o Brasil, apresentando personagens simplórios, que não entram no jogo desenvolvimentista e não têm projeto de vida e/ou político. Além disso, as chanchadas se caracterizaram pelas inúmeras paródias de Hollywood, como Nem Sansão nem Dalila, em alusão ao épico Sansão e Dalila, dirigido por Cecil B. DeMille; e Matar ou Correr, paródia do faroeste clássico de Fred Zinnemann Matar ou Morrer, de 1952.
Vera Cruz e o cinema Industrial
Germinada nas coxias do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), a Vera Cruz tinha como proposta produzir um cinema de arte, com fortes influências do cinema europeu. Criada em 1949, fruto das ideias e do dinheiro de Franco Zampari com a ajuda pecuniária de Francisco Matarazzo, tinha como “missão” elevar o cinema brasileiro ao nível do cosmopolitismo e da urbanidade que o avanço da industrialização em São Paulo prenunciava.
Durante os pouco mais de cinco anos de existência da Companhia Cinematográfica Vera Cruz (1949-1954), foram produzidos 18 filmes de ficção, através dos quais é possível perceber a representação da nação brasileira em toda a sua diversidade e complexidade, que não se limitava a espelhar a visão da burguesia industrial sobre o país, mesmo sendo ela a financiadora da companhia. Sem dúvidas, esses foram os dois principais legados da Vera Cruz para o cinema brasileiro: o aprimoramento técnico de nossas produções e um retrato plural da nação brasileira.
Cinema Novo
Glauber Rocha: o país sob uma outra perspectiva |
Com o slogan "uma câmera na mão e uma ideia na cabeça", jovens cineastas buscaram filmar o povo brasileiro da forma mais próxima possível, demonstrando suas vivências, histórias, tragédias, lendas, musicalidade e religiosidade como expressões legítimas da alma brasileira.
Com um viés mais analítico do que o cinema produzido anteriormente no Brasil, os cinemanovistas, liderados por Glauber Rocha, viam o cinema de autor como a alternativa capaz de estabelecer um discurso cinematográfico condizente com o novo panorama político do país, onde a repressão era a ordem. Agora, a cultura popular deixa de ser apenas conteúdo para fazer parte da estrutura dos filmes. Há momentos em Deus e o Diabo na Terra do Sol que a balada do cantador de cordel organiza o andamento das ações, por exemplo.
O que esse movimento trouxe foi a análise da identidade nacional ao nível do detalhamento formal e de conteúdo, aprofundando como nunca o escrutínio da nossa própria história.
- Artigo escrito com informações e trechos extraídos do livro Cinema e identidade nacional no Brasil 1898-1969, de Maurício R. Gonçalves, publicado pela LCTE Editora.
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